01 janeiro 2014

UM BARCO

Um barco. Um barco é um bom local para se começar uma história. Um barco encalhado. Na sua lenta e melancólica morte. Um barco naufragado. Reciclando-se sereno em corais. Um barco a navegar. Desafiando a natureza das coisas ele próprio. Um bom local para se começar uma história. Sobre as águas. Um barco que é a sua própria nação. Ilha errante a ferir aquele universo hostil e imperscrutável. Aquele país de monstros gigantes. Serpentes cruéis, polvos que dilacerem baleias. País também dos peixes, dos botos e das sereias. Sim, um barco é um local para se começar uma história. Uma história de seus habitantes. De pescadores, corsários e navegantes, fugitivos, náufragos e guerreiros. Homens que nasceram jogados ao mar num batismo atávico. Homens que morreram jogados ao mar, na pequenez de seu corpo abandonado à deriva. Homens que viveram sobre as águas, crispada a pele em sal e sol. Um bom local para começar uma história. Lagoa da Conceição, dez’13

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