04 julho 2009

RISCO NO CÉU

Hoje fiquei aqui sozinho em casa. Os petizes num festerê e eu aqui sozinho. E coloquei prá tocar Risco no Céu. O disco tão desejado e perseguido pelo Carlinhos Hartlieb. O disco que o próprio Carlinhos nunca viu. O disco que os amigos conseguiram, anos depois, lançar in memorium. Na capa, o Carlinhos com seu inseparável chapéu. O Carlinhos dos oclinhos, que cruzávamos lá caminhando pela areia da Praia do Rosa de outros decênios. Onde tudo nos era possível.

Na capa, o Carlinhos na frente da sua casa, tocando violão, como ele sempre fazia. A casa onde o corpo do Carlinhos foi encontrado pendurado numa corda, como se ele, o doce Carlinhos, tivesse acabado com sua própria vida. Como se todos nós acreditássemos nisto. O tranqüilo Carlinhos de certa forma era nosso porta voz. O Carlinhos e sua música inconfundível. Sua produção tão promissora que se resumiu a um disco póstumo. Quantos outros Van Goghs ganharam a posteridade após desaparecerem? Porém este nosso teve seu futuro brutalmente interrompido em alguma pedra do costão entre o Rosa e o Luz, por alguém que talvez não aceitasse sua postura alegre e zen. Seu modo de vida. Seu violão e seu astral.

Hoje eu olho o mesmo mar aquele do antigo Rosa. E escuto um mp3 do disco. Coisa moderna que o Carlinhos mesmo nunca sequer sonhou conhecer. Mas tocando um disco que não tem tempo que joga milongas atávicas sobre os pés descalços na areia tocada pelos ventos. Carlinhos por aqui vivo, vivendo a vida eterna na sua obra. Na sua pequena obra que chegou até mim nas costas dos bits que navegam por um rio virtual que se espalha pelo mundo.

Aliás eu percebi que “Por favor sucesso”, ganhador de festivais, era de um riograndense, no caso o nosso Carlinhos, quando ouvi uma estrofe muito marcante: “veja menina enquanto a chaleira esfria”. Quem se preocuparia com uma chaleira esfriando se não um mateador? Quem marcaria desta forma uma música? Logo uma música “que será sucesso durante um mês”, se não o Carlinhos? O Carlinhos que adotou Santa Catarina como tantos outros que vieram de lá atrás de um lugar melhor para se viver, de uma vida sem tantos simulacros como lá naquele porto que já foi alegre, atrás de um povo mais honesto e feliz. Atrás de uma tainha escalada e de uma pinga do Macacú. De uma casinha no Caminho do Rei.

Pena, apesar de estar com o Carlinhos aqui na trilha sonora, não ter mais o Carlinhos que se foi. O Carlinhos iterativo que tomava um mate e tocava violão em volta de uma fogueira, numa noite aberta de inverno, na lua cheia do Rosa.

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