21 outubro 2009

O PINTO VIRANDO FRANGOTE

Há dois dias, passei pelo Itaguaçú e visitei as gaivotas. O pinto estava bem visível na pedra do ninho. Movia-se já com uma certa desenvoltura, ainda sob o olhar cuidadoso da mãe, que o observava à distância.

O dia ostentava nuvens baixas que se imiscuíam com os morros, além da calmaria e da maré muito baixa fazendo com que as pedras expusessem seus limos.

Já hoje tem um vento fraco desde o sudeste e uma nevoa que esconde os morros, mas o mar se apresenta alto e tem certa força, com alguns respingos sobre a pedra do ninho. O filhote está lá, sobre as palhas, e a mãe ao lado, na pedra mesma. Interessante como o filhote se camufla bem entre as palhas. A plumagem infantil se mistura à cor do ninho e a evolução, ainda negada por alguns, se incumbiu de mimetizá-los.

Nosso pinto já virou um frango quase do tamanho dos pais. Coça as penas talvez sonhando com o dia em que alçará voo.

Ao largo, outras gaivotas planam procurando comida. Ou apenas se divertem ao sabor do vento. Sabe-se lá o que pensam os pássaros.

Já os humanos, estes primatas barulhentos, passam em seus carros. Indiferentes à névoa, ao vento e às gaivotas. Todos, exceto um que, como eu, tenta enxergar o sul através do vento.

A outra gaivota pousa sobre a pedra do ninho. Caminha na diagonal do filhote, abre lentamente as asas e voa até a pedra do namoro. O frangote se levanta, abre as asas, mas volta ao aconchego das palhas. O pai retorna de sua demonstração e pousa na pedra. Zeloso professor.

O filhote vai até seu encontro e deve ter recebido algum petisco. Um gostoso peixinho regurgitado.

Logo a seguir, um terceiro adulto se aproxima. O pai estica o pescoço em alerta e o frango some da vista no ninho. O macho alça voo e consigo, a muito custo aqui da praia, distinguir o infante. Agachado e quieto no ninho. A mãe permanece sobre a pedra, no mesmo local onde estava desde que cheguei. O pai sai atrás do intruso e, pouco tempo depois, a mãe alça voo também.

Passa o tempo e os adultos chegam ao ninho quase ao mesmo instante. O frangote finalmente se levanta do ninho e vai em direção aos pais. Está seguro. O primeiro adulto sai voando. O segundo caminha um pouco sobre a pedra e também voa, deixando o filhote novamente sozinho. É como se eles dissessem: Vem, filho, voa! Mas o coitado pula, bate as asas meio desajeitado e não consegue ir além. A envergadura de suas asas já está de bom tamanho, mas a tentativa não foi muito convincente.

Um dos pais, após esta lição, volta à pedra e se posta ao lado do ninho em pé. Mais um pouco e o filhote estará acompanhando os pais pelos ares. Aprenderá a pescar e a brigar pelos restos dos restaurantes na beira da praia. Verá como o mundo é muito maior que aquela pedra e se aventurará pelos ares e pelo mar.

Os adultos se alternam. Precisam levar mais comida para que o filhote a processe em ossos, músculos e penas. E cocô também, mas isto só servirá para agregar mais matéria orgânica à árida pedra que de há muito ostenta uma coroa de vida.

Um raro gavião passa piando o seu pio de águia, mas o ovo já virou pinto e o pinto já virou um frango que já não tem mais tamanho para virar janta para aquele ameaçador e minúsculo rapineiro.

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